O que mudou nas projeções para a safra de soja?
O analista de mercado Alexandre Mendonça de Barros comenta os impactos do clima sobre o andamento do plantio de grãos e apresenta as novas perspectivas para a safra de soja 23/24.Estimativas divulgadas pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) e pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) indicavam, inicialmente, uma safra de soja recorde para o Brasil em 2023/24.
Analistas de mercado e órgãos oficiais projetavam crescimento da área cultivada de soja, impulsionado pelos investimentos em tecnologia realizados pelos produtores brasileiros e pelo uso de novas variedades em regiões com alto potencial produtivo. As expectativas apontavam para uma produção entre 163 e 165 milhões de toneladas, superando a safra de soja anterior .
"Vale lembrar que na última safra de soja estávamos em um contexto de La Niña, que penalizou o Sul do Brasil. Além disso, houve quebras muito importantes na Argentina e até uma redução do potencial produtivo do Paraguai", afirma o analista de mercado Alexandre Mendonça de Barros.
Por esse motivo, a perspectiva para a safra de soja 23/24 era de maior produção nas regiões centrais do país, além da retomada no Rio Grande do Sul, na Argentina e no Paraguai, favorecendo a recuperação dos estoques globais. Ainda assim, o especialista pondera que será difícil reproduzir os resultados das safras de soja anteriores, sobretudo no Cerrado brasileiro.
Impactos e desafios da safra de soja brasileira
O clima tem sido o principal fator a influenciar o andamento da safra de soja brasileira. Segundo Alexandre Mendonça de Barros, modelos de análise dos Estados Unidos indicam que os efeitos do El Niño devem se estender até o início de 2024, com tendência de neutralidade a partir do segundo semestre.
Ele explica que o início da safra foi considerado regular, com algumas regiões em ritmo acelerado. Porém, ao longo das operações de plantio, o Cerrado foi prejudicado pela irregularidade das chuvas. "Houve replantio de safra em algumas áreas e potencial produtivo em baixa por causa das temperaturas extremamente elevadas. Vários colegas de campo reportaram escaldaduras em plantas e começaram a observar falhas significativas de estandes”, afirma.
Essas condições climáticas comprometeram o ritmo do plantio de soja, com atrasos em estados como Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Inicialmente, o andamento estava em linha com a velocidade registrada no ano passado, mas passou a ficar abaixo da média histórica.
No Maranhão, Piauí, Tocantins e Bahia, regiões que tradicionalmente sofrem com escassez hídrica em anos de El Niño, também foi observado atraso relevante nas operações das lavouras de soja.
Quanto às chuvas, o modelo americano de precipitação aponta que devem ficar abaixo da média histórica. Dezembro tende a ser mais seco que o normal nas regiões centrais e no Nordeste do Brasil, enquanto o Sul deve registrar chuvas acima da média. A partir de janeiro, a expectativa é de enfraquecimento do El Niño, cenário que pode influenciar diretamente o rendimento e a colheita de soja.
Como fica a safrinha de milho?
Para Mendonça de Barros, o cenário da safra de soja também deixa em aberto a situação da próxima safrinha do milho, já que a instabilidade no calendário de plantio da oleaginosa pode impactar diretamente o cultivo do cereal.
"Em nosso entendimento, já houve uma redução de área do milho por conta da expansão do algodão e da incerteza quanto à formação de preços do milho", destaca o analista.
Ele lembra ainda que os estoques estão elevados e que a seca provocou dificuldades logísticas para a exportação, pois vários rios do Norte do país secaram, impedindo o fluxo normal dos embarques. "Há acúmulo de milho e pressão sobre os preços. Nossa leitura é que, mais uma vez, há uma incerteza muito grande quanto à safrinha", acrescenta.
O que esperar da safra 23/24?
Na avaliação de Mendonça de Barros, a safra de soja deve encerrar próxima de 156 milhões de toneladas. "Minha impressão é que já perdemos uma parte do potencial produtivo da soja. Também parece difícil apostar em uma produção de milho como a que tivemos este ano."
Por outro lado, o analista ressalta que esse cenário evidencia a relevância do Brasil no mercado agrícola internacional. O país é o maior exportador de soja do mundo e, em 2023, tornou-se também o principal exportador de milho. Assim, as expectativas eram de que Brasil, Argentina e Paraguai alcançassem níveis próximos da produção máxima, entregando soja suficiente para repor e até ampliar os estoques globais. Agora, porém, surgem dúvidas sobre a intensidade dessa recuperação.
"Vale lembrar que o fechamento da safra dos Estados Unidos tornou claro que os estoques americanos estão muito baixos. Vai ser muito difícil medir essa safra, teremos uma variação enorme entre regiões brasileiras porque as chuvas não estão incidindo de maneira generalizada. A depender do comportamento do clima nas próximas semanas, esses números podem ser ainda menores", conclui Mendonça de Barros.